A interrupção da ligação de Santos à Mogi para proteger a riqueza das Geraes
Os
caminhos do sertão que foram percorridos durante o século XVII, vão ao
final deste mesmo século provocar uma grande mudança na vida da colônia.
Por
volta de 1694 – 1696, na região que ficará conhecida por Minas Gerais, a
descoberta de ouro provocou efeitos que se fizeram sentir na vida da
colônia como também fora dela.
A
partir da descoberta houve um êxodo populacional de várias regiões da
colônia em direção às minas, surgiram mercados de abastecimento que
deram um novo sentido à economia colonial, novos caminhos de penetração
para o interior foram trilhados, aumento geral nos preços de variada
mercadoria nas áreas auríferas, assim como o ouro das minas foi
necessário para o desenvolvimento da Revolução Industrial na Inglaterra
no século XVIII.
Contava
a vila de Mogi exatamente com cem anos quando foi publicado no ano de
1711 em Portugal o livro, Cultura e Opulência do Brasil, composto de
seis grandes capítulos que se referiam a: açúcar, minas de ouro, tabaco,
gado, e descrevia os dois caminhos de entrada para as Minas Gerais onde
se encontravam as minas de ouro. Tão logo publicada, em 1711, todos os
volumes impressos de Cultura e Opulência do Brasil foram, por razões de
Estado, confiscados e destruídos por ordem do rei de Portugal, D. João V
ao Presidente do Conselho Ultramarino, Duque de Cadavel, por ordem de
20.03.1711, pois, principalmente a parte do livro tocante ao caminho
para as minas revelava o itinerário a ser seguido, as potencialidades da
região de mineração, constituindo-se em verdadeiro guia para empreender
viagem para aqueles que iriam tentar a sorte nas minas gerais e não
eram poucos.
Desde
os anos iniciais da descoberta, a noticia se espalhou como rastilho de
pólvora provocando uma “febre do ouro” que levou milhares de pessoas
para a região, como descreveu André João Antonil em Cultura e Opulência
do Brasil:” A
sede insaciável do ouro estimulou a tantos a deixarem suas terras e a
meterem-se por caminhos tão ásperos como são os das minas, que
dificultosamente se poderá dar conta do número de pessoas que atualmente
lá estão... dizem que mais de trinta mil almas se ocupam, umas em
catar, outras em mandar catar nos ribeiros de ouro, e outras em
negociar. Cada ano, vem nas frotas quantidade de portugueses e de
estrangeiros, para passarem as minas. Das cidades, vilas, recôncavos e
sertões do Brasil, vão brancos, pardos, e pretos, e muitos índios, de
que os paulistas se servem. A mistura é de toda a condição de
pessoas:homens e mulheres, moços e velhos, pobres e ricos, nobres e
plebeus, seculares e clérigos, e religiosos de diversos institutos,
muitos dos quais não tem no Brasil convento nem casa.”
Os
roteiros para as minas eram variados, um deles partia da Bahia, um
“caminho novo” e um “caminho velho” partindo do Rio de Janeiro e um “Roteiro do caminho da vila de São Paulo para as minas gerais e para o rio das Velhas”.Neste
ultimo caminho segundo Antonil o tempo gasto desde a vila de São Paulo
até a região das minas era de aproximadamente dois meses, “marchando à
paulista”
Marchar
à paulista significava a maneira como os paulistas desenvolveram suas
andanças pelo sertão no século XVII (inclusive habitantes de Mogi das
Cruzes) influenciados pela experiência indígena, sendo como os mapas
sertanistas mostram, as distancias entre dois pontos marcada pelos dias
de viagem e o ritmo da marcha compreendia o horário da madrugada até o
meio-dia, no máximo até 13 ou 14 horas para terem tempo de descansar, “de buscar alguma caça ou peixe e mel de pau”, o mel do sertão das abelhas indígenas como a jataí ou outro mantimento qualquer.
Saindo
da vila de São Paulo a primeira parada era em Nossa Senhora da Penha a
duas léguas (13Km), a próxima parada era a aldeia de Itaquaquecetuba
gastando um dia, de Itaquaquecetuba até a vila de Mogi, dois dias; de
Mogi vão até as Laranjeiras em mais quatro ou cinco dias; depois até
Jacareí mais um dia; de Jacareí até Taubaté dois dias, de Taubaté a
Pindamonhangaba um dia e meio; de Pindamonhangaba até Guaratinguetá
cinco ou seis dias. De Guaratinguetá caminhavam até o pé da serra quando
empreendiam a difícil subida da Serra da Mantiqueira, (onde diziam que
todo aquele que passou pela serra, aí deixou dependurada ou sepultada a
consciência), para ganhar finalmente o trecho final do caminho na serra
de Itatiaia, onde havia duas direções a seguir:uma ia dar nas minas do
ribeirão de Nossa Senhora do Carmo e do Ouro Preto em seis dias de
marcha e o outro para as minas do rio das Velhas, também em seis dias de
viagem.
Na
região das minas a carestia era geral e a moeda corrente a oitava de
ouro (3,586 gramas) e para o ano de 1703 Antonil apresentava uma lista
onde um boi valia oitenta oitavas; sessenta espigas de milho, trinta
oitavas; seis bolos de farinha de milho, três oitavas; paio, três
oitavas; galinha, três ou quatro oitavas; queijo da terra, três ou
quatro oitavas; espingarda, dezesseis oitavas; pistola, dez oitavas;
faca seis oitavas; canivete e tesoura, duas oitavas; escravo, trezentas a
seiscentas oitavas.
Essa
efervescência econômica no início do século dezoito, certamento
produzia efeitos em Mogi e região com o possível deslocamento de
moradores para a zona aurífera, assim como o contingente nada
desprezível de pessoas que por aqui passavam, segundo o roteiro
publicado por Antonil.
Outro
efeito da descoberta das minas foi de ordem administrativa com a
criação em 1709 da capitania de São Paulo e Minas de Ouro e em 1720 da
Capitania de Minas Gerais, a elaboração de uma série de leis
específicas, uma reordenação jurídica, criação de legislação tributária,
defesa e fortificação de vários pontos da colonia para impedir
possíveis invasões estrangeiras como era o caso da fortaleza da
Bertioga, reformada com pedra e argamassa em 1724 (ver Caminhos Antigos
IV) e o fechamento de caminhos do litoral para o planalto como é o caso
das rotas de Santos para Mogi em 1722.
A
região que hoje conhecemos por Taiaçupeba, outrora Campo Grande,
possivelmente era habitada desde a segunda década do século XVIII, tendo
atribuição de terras em 1723 “na vila de Santa Anna das Cruzes de Mogy... no caminho que vai da dita vila para a de Santos, na paragem chamada Tijuco Preto.”
(Grinberg,1961:32). Este caminho de Mogi a Santos era uma das veredas
fechadas por ordem real com o objetivo de evitar invasões estrangeiras.
Estabelecia a “Carta regia sobre a tapagem de caminhos para impedir invasões estrangeiras em S.Paulo e expulsão de estrangeiros e frades” o
fechamento de três caminhos da Vila de Mogi para a de Santos (mapa) e
consequentemente mandava que os moradores de Mogi usassem para ir a
Santos o caminho de São Paulo ou de Taubaté e vilas vizinhas com ligação
ao litoral e daí a Santos.
Ao
fechar os caminhos de Santos que subiam a Serra do Mar e daí para a
vila de Mogi das Cruzes, objetivava-se além de dificultar possíveis
invasões de países rivais de Portugal, criar obstáculos para
estrangeiros e religiosos, que desembarcando das frotas portuguesas, se
dirigiam para as minas como já havia apontado Antonil.
Para saber mais
Carta Régia – Documentos Interessantes para a história e costumes de São Paulo, vol.18, p.51
ANTONIL, André João. Cultura e Opulência do Brasil,S.P. Cia. Editora Nacional, 1966.Introdução A.P.Canabrava
HOLANDA,Sergio Buarque. Caminhos e Fronteiras, R.J.José Olympio, 1975
imagens: Biblioteca Ncional
Rio das Velhas/mineração
A
bacia hidrográfica do Rio das Velhas compreende desde sua nascente no
município de Ouro Preto passando por Sabará, Santa Luzia e Belo
Horizonte.
A
mineração feita nos rios foi predominante, chamada de mineração de
aluvião, feita nas areias e cascalhos dos rios, empregava mão de obra
escrava
Conversão oitava de ouro/grama
Para
efeito de ilustração e sem procurar total exatidão temos que a oitava
de ouro é igual a 3,5 gramas e hoje a grama de ouro vale $103 reais.
A
lista de produtos comercializados nas minas é extensa e pode ser
encontrada na obra completa de Antonil, disponível no site Domínio
Público.
O livro de Antonil
Foi
publicado no ano de 1711, em Portugal o livro do jesuíta João Antônio
Andreoni (Lucca, Toscana, 8 de fevereiro de 1649 - Salvador, 13 março de
1716): Cultura e Opulência do Brasil,
sob o pseudônimo de André João Antonil (neste artigo se utiliza Antonil
como referência) com a descrição dos dois caminhos de entrada para as
Minas Gerais onde se encontravam as minas de ouro.
Antonil
foi uma figura ímpar na colônia. Observador atento, escreveu com
profundidade e erudição sobre a realidade econômica da Colônia,
notadamente a produção de açúcar, de tabaco, sobre a criação de gado e a
mineração. Além de apresentar dados sobre a produção, descreveu ainda
as técnicas produtivas então utilizadas, comentando as condições de
trabalho e condições sociais e políticas vividas pela colônia.
Visando
proteger o comércio internacional de Portugal (fumo e açúcar) e também
resguardar a colônia contra possíveis invasões inimigas, facilitadas
pela exatidão do roteiro fornecido na publicação, o livro teve sua
primeira edição destruída em Portugal.
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