quarta-feira, 29 de junho de 2011

Congos, Congados e Moçambiques na Serra do Itapety (1929)

Antonio, Froes e Manuel dos Santos. Folia de Reis na Serra
do Itapety, Junho 2000
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Nas celebrações em homenagem ao Divino Espirito Santo as danças constituem uma de suas principais atrações. Proibidas no período da escravidão, muitas delas, em especial a Congada, o Moçambique e a Marujada conseguiram inserir-se neste contexto.
Verdadeiros bailados populares, estas “danças dramáticas”, no dizer de Mário de Andrade (1937), tem essencialmente uma função religiosa:
"Elas são expressões do sagrado, diversificadas pelo espírito lúdico, como as danças de São Gonçalo, Cururu e Congada quando articuladas com os sentidos religiosos do Divino ou de Nossa Senhora do Rosário. (CASCUDO, 1969, p. 532).
Constituem em última instância um “ato de devoção, que representa a alegria e o encontro da felicidade, que se dá através da música, da dança e do canto para prazerosamente proporcionar o caminho do diálogo e da comunhão com o Divino” (ARAUJO apud CHAVES, 2003, p. 35).
Além de sua função religiosa, estas danças cumpriam uma função social e educativa, estreitando os laços de solidariedade, criando uma identidade coletiva e o sentimento de pertença, principalmente nas áreas rurais, relativamente isoladas e organizadas em pequenas comunidades: o bairro.
Em Mogi das Cruzes, a Missão de Pesquisas Folclóricas da então recém-fundada Sociedade de Etnografia e Folclore, coordenada por Mário de Andrade, registra em película cinematográfica, dirigida por Dina Lévy-Strauss, datada de 30 de Maio de 1936, Congos, Congados e Cavalhadas, na área central da cidade.
A documentação sobre a ocorrência destes eventos em áreas rurais durante os anos 30 parece não ter sido levada a efeito por estudiosos e pesquisadores (talvez a única exceção pertence aos Inquéritos Folclóricos encaminhados pela citada Sociedade que apontam a ocorrência destas danças na região de Poá, pertencente ainda ao município de Mogi das Cruzes).
Em Mogi, um destes bairros, situado nos contrafortes da Serra do Itapety (atual Bairro Beija-Flor), parece ter cultivado estas formas de dança ainda na década de 20, conforme depoimento cedido pelo Sr. Joaquim de Souza Mello, nascido e criado nesta região, hoje contando com seus 74 anos, lembra-se da realização das Congadas e Monçabiques:
Seu Joaquim e Viola. Sítio da Goiaba,
Bairro Beija-Flor.

"Em 1929, no Itapety, o Sr. Benedito Pinheiro, proprietário do Sítio Duas Irmãs, era Mestre de Monçambique. Meu Pai dançava Congada, quando ainda eu era solteiro e também participava do Moçambique, que na época, contava entre 12 a 16 componentes."

Congada e Moçambique, que segundo o Sr. Joaquim, são bem diferentes:
"A Congada é diferente do Moçambique, na Congada a pessoa era sorteada, se aproximava do trono e do rei, chamado Belo, e tinha que beijar o pé do Rei. O rei da Congada, o Sr. Avelino, designado como o "Belo Sudário", teve inclusive um filho, batizado como Sudário."
A Congada permaneceu no Itapety por muitos anos, apresentando-se por toda a região:
"O pessoal ia a pé até o Bairro do Maracatu, em Guararema. Um primo do meu pai, muito brincalhão, antes de chegar nas fazendas para as festas, procurava por vestígios de bagaço de limão no rio, o que significava que um leitão fora preparado e assim, o repasto estava garantido. Agora, este bairro do Maracatu, é quase deserto. Antigamente, tinha muito mais gente do que hoje."
"Tinha uma venda, do Camilo, que o pessoal quando ia para a dança, cortava as mantas de carne seca. Pois é um negócio errado isso, mas meu pai contava essas coisas. Puxa, o cara vai fazer uma devoção... não é uma brincadeira... Comprasse né."
"Na Congada tinha o Rei, o Embaixador. Eu sei que era bonito. A Congada era muito bonita. Eu cheguei a dançar com o Dito Pinheiro, várias vezes. Ele dançava nas Igrejinhas, no Santo Alberto, na Moralogia (em uma igrejinha que não existe mais) e na Cruz do Pito."
"Na Cruz do Pito, o Salto, eram outros maestros de Moçambique, outros grupos. O moçambique do Zé Martins, do Dito Mathias. O Salto é o seguinte: Bairro do Itapety do Salto, no ribeirão do Salto. O Zé Rosa era o folgazão e mestre de São Gonçalo, também o Zé Pereira. O Zé Pereira, era casado com a irmã do Dito Pinheiro."
Na Congada, as pessoas se aproximavam do Rei, e declamavam pequenos versos:

Sou um soldadinho destemido,
De calça branca e botina numerada,
Subo morro, desco morro,
Com a mochila na cacunda.

A pinta que o galo tem,
O ovo tem na gema,
Uma é branca outra amarela,
A pinta que o galo tem,
o pinto saiu com ela.

Fontes:

ANDRADE, Mário de. A Entrada dos Palmitos. São Paulo: Revista do Arquivo Municipal XXXII, 1937, p. 51-64.
CASCUDO, Luís da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. 2. Vol. Rio de Janeiro: Edições de Ouro, 1969. p. 532.
CHAVES, Robson Belchior Oliveira. Salesópolis. Festa do Divino: das origens aos dias atuais. Dissertação de Mestrado. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2003.

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