sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Uma anarcofeminista no Theatro Vasques em 1911

Belén de Sarraga nasceu em Valladolid em 1874.

Foi feminista, leitora de Bakunin e Kropotkin, livre pensadora e militante anti clerical, tendo escrito “El clericalismo en América”.

Defendia a liberdade de consciência, a liberdade de instrução, a tolerância e os objetivos pacifistas

Na Espanha esteve presa durante alguns meses por pronunciar um discurso contra um general responsável pelo fuzilamento de um poeta, militou ativamente durante a segunda república espanhola e percorreu a América, do México à Argentina, passando pelo Brasil, promovendo concorridas palestras onde o tema era a mulher, família, Estado e religião.

Na cidade de São Paulo chegou em abril de 1911, onde, um jornal local a chamou de “Anjo da Revolução”. Em sua conferencia assinalava: “Diz-se com razão que a família é a base dos Estados. Tem estes de ser, portanto, o que a família é; a cultura, o valor moral, as tendências profundas e características da comunidade social são outros tantos reflexos das qualidades e dos defeitos daquela unidade básica. Mas a família por sua vez tem um centro, uma célula mater, uma base insubstituível: a mulher-mãe. Portanto, os destinos do Estado repousam, em ultima analise, na educação da mulher, na mãe de família.”

Em Mogi das Cruzes algumas pessoas se agitavam e formavam uma comissão para trazer Belén Sárraga à cidade, uns movidos pelo anticlericalismo das idéias de Sárraga, outros pelo humanitarismo e ainda outros pelas posições políticas sobre o poder (poder dos homens sobre as mulheres, poder de Estado, etc), pois, a cidade apresentava um alto índice de imigrantes espanhóis e italianos que compartilhavam destas posições.

A cidade se preparava para receber o “Anjo da Revolução” e o vigário da Matriz dizia: “Chegou nesta cidade a exploradora espanhola Bélen Sárraga, espanhola expulsa de sua pátria por causa das ideias subversivas que pregava. Os católicos desta cidade não tomaram parte nas festas dessa espanhola. As senhoras (mais de mil) prottestaram contra a vinda dessa anticlerical.”

No dia 22 de junho de 1911, uma quinta-feira, Bélen Sárraga chegava por trem de subúrbio e era conduzida ao Teatro Vasques para falar sobre um tema que envolvia formas de poder:”A família e a Igreja”.

Apresentada por um ex-sacerdote católico, iniciou sua fala as nove e trinta e as onze horas se dirigia ao hotel onde ficou hospedada, acompanhada por “uma massa compacta” segundo o jornal “A Vida”.

No dia seguinte, seu destino era novamente a capital e outras peregrinações em torno da liberdade e das vontades do ser.

Fontes:

Livro do Tombo da Cúria Diocesana de Mogi das Cruzes

Jornal “A Vida” 25/06/1911

sábado, 12 de novembro de 2011

A escravidão em Mogi das Cruzes II 1872


A leitura e interpretação dos censos indicam possibilidades de pesquisa em História.
A população livre no município de Mogi das Cruzes pelo censo de 1872 era de 15033 habitantes, sendo 10301 em Mogi das Cruzes, 1788 na Freguesia de Itaquaquecetuba, 1463 na Escada e 1531 em Arujá. No município de São José do Paraytinga havia 3042 livres.
Dentre os livres havia no recenseamento de 1872 as seguintes categorias: sexo, estado civil, brancos, pardos, pretos, caboclos, religião, nacionalidades, instrução e casas.
O quadro geral da população escrava contava com as categorias sexo, estado civil, raça, religião, nacionalidade e grau de instrução.
A região de Mogi das Cruzes contava com 1496 cativos, Santa Isabel 1105, Santa Branca 967 e São José do Paraytinga 161.No quesito instrução, a cidade de Mogi apresentava 1% da população escrava alfabetizados, enquanto em outras regiões esse número era menor ou nulo e somente Itu apresentava número semelhante a Mogi. Isto poderia indicar as características da região e da escravidão urbana , voltada para os escravos de ganho.
No quadro referente a “defeitos physicos” encontramos as categorias Livres – Escravos, com os seguintes números:Para os livres, entre cegos, surdo mudos, aleijados e problemas mentais encontramos por volta de 15% da população da região, sendo que o número de mulheres com problemas mentais superava em quase 40% o número de homens, o que poderia indicar as condições em que viviam e eram tratadas as mulheres.
Entre os escravos, em números absolutos, a maior deficiência física constatada no recenseamento, se dava na categoria “cegos”, o que confirmava o trabalho pioneiro do médico Manoel da Gama Lobo, "Da oftalmia brasiliana", publicada originalmente em 1865 sobre a deficiência nutricional causada pelas degradantes condições de vida do escravo e os problemas na visão decorrentes desta deficiência nutricional.
O trabalho excessivo, a alimentação insuficiente, os castigos corporais em excesso transformam estes entes miseráveis em verdadeiras máquinas de fazer dinheiro; sem direito de casamento, sem laço algum de amizade que os ligue sobre a terra, eles perdem o ânimo, sendo vítimas de opilações, úlceras crônicas, caquexias e todas as moléstias que são ocasionadas por uma alimentação insuficiente.” (Gama Lobo, 1865a, p.432).




VASCONCELOS, Francisco de Assis Guedes de; SANTOS, Leonor Maria Pacheco. Tributo a Manoel da Gama Lobo (1835-1883), pioneiro na epidemiologia da deficiência de vitamina A no Brasil. Hist. cienc. saude-Manguinhos, Rio de Janeiro, v. 14, n. 4, Dec. 200Availablefrom. access on 26 Mar. 2011. doi: 10.1590/S0104-59702007000400013.