terça-feira, 4 de setembro de 2012

Caminhos Antigos XIII



A interrupção da ligação de Santos à Mogi para proteger a riqueza das Geraes

Os caminhos do sertão que foram percorridos durante o século XVII, vão ao final deste mesmo século provocar uma grande mudança na vida da colônia.
Por volta de 1694 – 1696, na região que ficará conhecida por Minas Gerais, a descoberta de ouro provocou efeitos que se fizeram sentir na vida da colônia como também fora dela.
A partir da descoberta houve um êxodo populacional de várias regiões da colônia em direção às minas, surgiram mercados de abastecimento que deram um novo sentido à economia colonial, novos caminhos de penetração para o interior foram trilhados, aumento geral nos preços de variada mercadoria nas áreas auríferas, assim como o ouro das minas foi necessário para o desenvolvimento da Revolução Industrial na Inglaterra no século XVIII.
Contava a vila de Mogi exatamente com cem anos quando foi publicado no ano de 1711 em Portugal o livro, Cultura e Opulência do Brasil, composto de seis grandes capítulos que se referiam a: açúcar, minas de ouro, tabaco, gado, e descrevia os dois caminhos de entrada para as Minas Gerais onde se encontravam as minas de ouro. Tão logo publicada, em 1711, todos os volumes impressos de Cultura e Opulência do Brasil foram, por razões de Estado, confiscados e destruídos por ordem do rei de Portugal, D. João V ao Presidente do Conselho Ultramarino, Duque de Cadavel, por ordem de 20.03.1711, pois, principalmente a parte do livro tocante ao caminho para as minas revelava o itinerário a ser seguido, as potencialidades da região de mineração, constituindo-se em verdadeiro guia para empreender viagem para aqueles que iriam tentar a sorte nas minas gerais e não eram poucos.
Desde os anos iniciais da descoberta, a noticia se espalhou como rastilho de pólvora provocando uma “febre do ouro” que levou milhares de pessoas para a região, como descreveu André João Antonil em Cultura e Opulência do Brasil:” A sede insaciável do ouro estimulou a tantos a deixarem suas terras e a meterem-se por caminhos tão ásperos como são os das minas, que dificultosamente se poderá dar conta do número de pessoas que atualmente lá estão... dizem que mais de trinta mil almas se ocupam, umas em catar, outras em mandar catar nos ribeiros de ouro, e outras em negociar. Cada ano, vem nas frotas quantidade de portugueses e de estrangeiros, para passarem as minas. Das cidades, vilas, recôncavos e sertões do Brasil, vão brancos, pardos, e pretos, e muitos índios, de que os paulistas se servem. A mistura é de toda a condição de pessoas:homens e mulheres, moços e velhos, pobres e ricos, nobres e plebeus, seculares e clérigos, e religiosos de diversos institutos, muitos dos quais não tem no Brasil convento nem casa.”
Os roteiros para as minas eram variados, um deles partia da Bahia, um “caminho novo” e um “caminho velho” partindo do Rio de Janeiro e um “Roteiro do caminho da vila de São Paulo para as minas gerais e para o rio das Velhas”.Neste ultimo caminho segundo Antonil o tempo gasto desde a vila de São Paulo até a região das minas era de aproximadamente dois meses, “marchando à paulista”
Marchar à paulista significava a maneira como os paulistas desenvolveram suas andanças pelo sertão no século XVII (inclusive habitantes de Mogi das Cruzes) influenciados pela experiência indígena, sendo como os mapas sertanistas mostram, as distancias entre dois pontos marcada pelos dias de viagem e o ritmo da marcha compreendia o horário da madrugada até o meio-dia, no máximo até 13 ou 14 horas para terem tempo de descansar, “de buscar alguma caça ou peixe e mel de pau”, o mel do sertão das abelhas indígenas como a jataí ou outro mantimento qualquer.
Saindo da vila de São Paulo a primeira parada era em Nossa Senhora da Penha a duas léguas (13Km), a próxima parada era a aldeia de Itaquaquecetuba gastando um dia, de Itaquaquecetuba até a vila de Mogi, dois dias; de Mogi vão até as Laranjeiras em mais quatro ou cinco dias; depois até Jacareí mais um dia; de Jacareí até Taubaté dois dias, de Taubaté a Pindamonhangaba um dia e meio; de Pindamonhangaba até Guaratinguetá cinco ou seis dias. De Guaratinguetá caminhavam até o pé da serra quando empreendiam a difícil subida da Serra da Mantiqueira, (onde diziam que todo aquele que passou pela serra, aí deixou dependurada ou sepultada a consciência), para ganhar finalmente o trecho final do caminho na serra de Itatiaia, onde havia duas direções a seguir:uma ia dar nas minas do ribeirão de Nossa Senhora do Carmo e do Ouro Preto em seis dias de marcha e o outro para as minas do rio das Velhas, também em seis dias de viagem.
Na região das minas a carestia era geral e a moeda corrente a oitava de ouro (3,586 gramas) e para o ano de 1703 Antonil apresentava uma lista onde um boi valia oitenta oitavas; sessenta espigas de milho, trinta oitavas; seis bolos de farinha de milho, três oitavas; paio, três oitavas; galinha, três ou quatro oitavas; queijo da terra, três ou quatro oitavas; espingarda, dezesseis oitavas; pistola, dez oitavas; faca seis oitavas; canivete e tesoura, duas oitavas; escravo, trezentas a seiscentas oitavas.
Essa efervescência econômica no início do século dezoito, certamento produzia efeitos em Mogi e região com o possível deslocamento de moradores para a zona aurífera, assim como o contingente nada desprezível de pessoas que por aqui passavam, segundo o roteiro publicado por Antonil.
Outro efeito da descoberta das minas foi de ordem administrativa com a criação em 1709 da capitania de São Paulo e Minas de Ouro e em 1720 da Capitania de Minas Gerais, a elaboração de uma série de leis específicas, uma reordenação jurídica, criação de legislação tributária, defesa e fortificação de vários pontos da colonia para impedir possíveis invasões estrangeiras como era o caso da fortaleza da Bertioga, reformada com pedra e argamassa em 1724 (ver Caminhos Antigos IV) e o fechamento de caminhos do litoral para o planalto como é o caso das rotas de Santos para Mogi em 1722.
A região que hoje conhecemos por Taiaçupeba, outrora Campo Grande, possivelmente era habitada desde a segunda década do século XVIII, tendo atribuição de terras em 1723 “na vila de Santa Anna das Cruzes de Mogy... no caminho que vai da dita vila para a de Santos, na paragem chamada Tijuco Preto.” (Grinberg,1961:32). Este caminho de Mogi a Santos era uma das veredas fechadas por ordem real com o objetivo de evitar invasões estrangeiras.
Estabelecia a “Carta regia sobre a tapagem de caminhos para impedir invasões estrangeiras em S.Paulo e expulsão de estrangeiros e frades” o fechamento de três caminhos da Vila de Mogi para a de Santos (mapa) e consequentemente mandava que os moradores de Mogi usassem para ir a Santos o caminho de São Paulo ou de Taubaté e vilas vizinhas com ligação ao litoral e daí a Santos.
Ao fechar os caminhos de Santos que subiam a Serra do Mar e daí para a vila de Mogi das Cruzes, objetivava-se além de dificultar possíveis invasões de países rivais de Portugal, criar obstáculos para estrangeiros e religiosos, que desembarcando das frotas portuguesas, se dirigiam para as minas como já havia apontado Antonil.

Para saber mais
Carta Régia – Documentos Interessantes para a história e costumes de São Paulo, vol.18, p.51
ANTONIL, André João. Cultura e Opulência do Brasil,S.P. Cia. Editora Nacional, 1966.Introdução A.P.Canabrava
HOLANDA,Sergio Buarque. Caminhos e Fronteiras, R.J.José Olympio, 1975
imagens: Biblioteca Ncional 


Rio das Velhas/mineração
A bacia hidrográfica do Rio das Velhas compreende desde sua nascente no município de Ouro Preto passando por Sabará, Santa Luzia e Belo Horizonte.
A mineração feita nos rios foi predominante, chamada de mineração de aluvião, feita nas areias e cascalhos dos rios, empregava mão de obra escrava

Conversão oitava de ouro/grama
Para efeito de ilustração e sem procurar total exatidão temos que a oitava de ouro é igual a 3,5 gramas e hoje a grama de ouro vale $103 reais.
A lista de produtos comercializados nas minas é extensa e pode ser encontrada na obra completa de Antonil, disponível no site Domínio Público.

O livro de Antonil
Foi publicado no ano de 1711, em Portugal o livro do jesuíta João Antônio Andreoni (Lucca, Toscana, 8 de fevereiro de 1649 - Salvador, 13 março de 1716): Cultura e Opulência do Brasil, sob o pseudônimo de André João Antonil (neste artigo se utiliza Antonil como referência) com a descrição dos dois caminhos de entrada para as Minas Gerais onde se encontravam as minas de ouro.
Antonil foi uma figura ímpar na colônia. Observador atento, escreveu com profundidade e erudição sobre a realidade econômica da Colônia, notadamente a produção de açúcar, de tabaco, sobre a criação de gado e a mineração. Além de apresentar dados sobre a produção, descreveu ainda as técnicas produtivas então utilizadas, comentando as condições de trabalho e condições sociais e políticas vividas pela colônia.
Visando proteger o comércio internacional de Portugal (fumo e açúcar) e também resguardar a colônia contra possíveis invasões inimigas, facilitadas pela exatidão do roteiro fornecido na publicação, o livro teve sua primeira edição destruída em Portugal.

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